Onde você gostaria de passar seus últimos dias: em casa ou no hospital? Em Curitiba, os pacientes com doenças terminais que escolhem o aconchego do lar, ao lado da família, contam com atendimento especializado da equipe de cuidados paliativos do programa Saúde em Casa.
Hoje, 35 pacientes com este perfil são acompanhados pelo Saúde em Casa. O aposentado Pedro de Paula, 90 anos, é um deles. Recebe assistência desde setembro de 2022, quando recebeu o diagnóstico da evolução de um tumor renal. Para o filho Mauro de Paula, um dos cuidadores, o atendimento do programa tem sido um alívio.
“Quando meu pai saiu do hospital, eu me senti perdido”, conta Mauro. “O que nos passaram sobre o estado de saúde dele foi muito duro. Parecia que estávamos levando (meu pai) para casa para morrer e eu não tinha ideia de como iria ser”, relembra.
A família foi orientada a pedir o acompanhamento do Saúde em Casa na unidade de saúde Parque Industrial, no Capão Raso, onde seu Pedro é atendido. Anderson de Paula, irmão de Mauro e cuidador, foi até lá para incluir o pai nos cuidados paliativos do programa assim que ele deixou o hospital.
Os irmãos não sabiam da existência do programa e achavam que os profissionais de saúde iriam demorar para procurá-los. “Naquele mesmo dia, à tarde, bateram palmas no portão. Era a equipe: a gente não estava mais sozinho”, relata Mauro, emocionado. “Eles são maravilhosos, nos auxiliam em tudo, além de serem muito atenciosos com nosso pai”, acrescenta.
Segundo Anderson, a equipe trouxe dignidade nesta fase de vida do seu Pedro. “Aqui ele tem a rotina dele, o cantinho dele no sofá, onde assiste à televisão. Imagina ele no quarto de um hospital?”, compara. Seu Pedro viveu toda a vida no campo, sempre muito ativo. Ficou viúvo há 23 anos. Quando soube da evolução da doença, preferiu ficar na companhia dos filhos.
Inicialmente, o aposentado oferecia resistência ao internamento hospitalar e até mesmo à equipe domiciliar. “Com o tempo e dedicação às necessidades, respeitando o desejo do paciente, fomos criando vínculo e conquistando a confiança de Pedro e sua família”, lembra a médica Gabriella Barbosa Nadas, integrante da equipe de cuidados paliativos.
Prova disso foi vista em uma das visitas mais recentes, quando os profissionais de saúde estiveram na casa da família para uma consulta médica de rotina e coleta de sangue para exames. Outrora relutante, o aposentado agora conta os dias para receber a equipe, por quem demonstra muito carinho.
Na estante da sala, entre fotografias com familiares, há quadros com os profissionais. Um deles é especial: da primeira festa de aniversário da vida de seu Pedro, aos 90 anos, organizada pela equipe. “Meu pai não quis convidar mais ninguém para a festa. Eu até perguntei, mas ele queria só a equipe que cuida dele”, reforça Anderson.
“As fotos são uma forma dele demonstrar agradecimento por toda a dedicação da equipe”, explica o filho. Bem-humorado, seu Pedro prefere não dizer quem é seu profissional de saúde favorito. “Gosto de todos. São ótimos comigo”, diz o paciente, brincando que não foi ele quem convidou os profissionais para a festa, mas a equipe que o convidou.
Compromisso
“O programa é importante dentro da nossa estratégia de assistência, da unidade de saúde à atenção hospitalar, e se consolidou pela qualidade do serviço e pelo compromisso de suas equipes, o que se estende aos cuidados paliativos”, enfatiza a secretária municipal da Saúde, Beatriz Battistella.
Criadas em 2020, as equipes de cuidados paliativos são formadas por médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, assistente social e fisioterapeutas. Recebem suporte das equipes domiciliares de apoio, composta por nutricionista, fonoaudiólogo, farmacêutico e psicólogo.
Segundo a gerente do programa, Mariana Lous, nos últimos anos, o Saúde em Casa vem expandindo seus atendimentos a pacientes com casos clínicos mais complexos, com a implantação das equipes de especialidades. Além da equipe domiciliar de cuidados paliativos, Curitiba oferece atendimento domiciliar em ventilação mecânica adulto, pediatria, oxigenoterapia e ortopedia.
“Os cuidados paliativos trazem o paciente para o centro do cuidado, respeitando seus valores e princípios e dando escuta de como ele deseja ser cuidado”, define a médica Gabriella.
O diferencial do atendimento é proporcionar um olhar multidimensional. “De forma interdisciplinar, visamos proporcionar o cuidado integral e holístico, respeitando a dignidade de cada paciente”, descreve o fisioterapeuta da equipe, Bernardo Costa Araujo.
O serviço também visa a “instrumentalização” de cuidados em domicílio, orientando e auxiliando familiares e cuidadores.
“Pensar na possibilidade de um processo de terminalidade no domicílio, por vezes, pode parecer utópico, mas nossa equipe tem acesso a medicações de alta complexidade para a desospitalização e conforto dos pacientes neste período”, analisa Lorena Almeida Sant’Ana, outra médica da equipe.
O atendimento em cuidados paliativos costuma ser mais frequente e ter duração maior para que os profissionais possam entender melhor o contexto de vida e anseios desse paciente. O tempo de permanência no programa varia de 60 a 90 dias, conforme o caso clínico.
“Pacientes que apresentam estabilidade durante o período, tendo seus sintomas ‘paliados’, podem ser referenciados à unidade básica de saúde ou ao serviço ambulatorial do seu hospital”, informa Lorena.
Saúde em Casa
O programa de atendimento domiciliar conta com 160 profissionais de saúde, divididos em 15 Equipes Multidisciplinares de Atenção Domiciliar (EMADs), que incluem as especialidades, e três Equipes Multidisciplinares de Apoio (EMAPs), além de 20 motoristas. Em 12 anos de existência foram mais de 70 mil pacientes atendidos.
Já os cuidados paliativos representam 100 atendimentos por mês. O número corresponde a 8,75% do total de pacientes acompanhados e 9,5% dos atendimentos de todo o programa, que conta com 15 equipes, no total.
O programa é administrado pela Fundação Estatal de Atenção à Saúde (Feas).
Feas
Com mais de 4 mil funcionários, a Feas é um órgão da administração indireta da Prefeitura de Curitiba, vinculada à Secretaria Municipal da Saúde (SMS). Administra 29 unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) de Curitiba, como o Hospital Municipal do Idoso e o programa de atenção domiciliar Saúde em Casa, o Centro Médico Comunitário Bairro Novo; as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) Tatuquara, Boqueirão, Fazendinha e CIC; a Central Saúde Já Curitiba; e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), além de outros equipamentos públicos.