Auxiliar do consultório dentário da Unidade de Saúde Lotiguaçu, no Uberaba, Nair de Fátima de Freitas Lima tem 35 anos de trabalho na Prefeitura. Durante a pandemia, fez parte da linha de frente do combate à covid-19, ajudando a organizar o fluxo da maior campanha de vacinação que Curitiba já teve, coordenada pela Secretaria Municipal da Saúde.
No sábado (17/9), Nair e outras 11 pessoas negras foram homenageadas durante a Caravana Étnico-Racial realizada no Cajuru, que destacou cidadãos e cidadãs afrodescendentes com atuação na comunidade.
“Tenho muito orgulho de ter participado da História. No futuro, minhas netas vão ouvir falar da pandemia e saber que eu e a minha equipe de odontologia trabalhamos para combater a covid”, diz ela.
Origens
História, família, atuação na comunidade. Correlações de vida que são caras à família de Nair – e começaram 165 anos atrás, em 1857, quando seu bisavô, Vicente Moreira de Freitas, nasceu escravizado na cidade.
A vida e feitos de Freitas foram pesquisados e catalogados para o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), em História, de um dos irmãos de Nair, Nei Luiz Moreira de Freitas.
O estudo deu corpo aos casos até então contados na tradição oral de bisavós para avós, pais, filhos e netos.
Das páginas do TCC emerge uma das primeiras lideranças do movimento negro curitibano.
Escravizado de um empresário do setor da construção, Freitas ajudou a construir alguns marcos do município, como a Igreja Matriz (atual Catedral de Curitiba), o Teatro São Theodoro e a Igreja do Bom Jesus, entre outras edificações que hoje fazem parte do cenário histórico da capital.
Ele conseguiu alforria quatro anos antes da Abolição, por meio do Fundo de Emancipação dos Escravos, e prosseguiu trabalhando no setor da construção como trabalhador assalariado.
Numa época de grandes dificuldades para os negros, passou a organizar e defender seus pares. Foi um dos criadores e o segundo presidente da Sociedade 13 de Maio, criada em 1888, meses após a assinatura da Abolição e que até hoje é uma referência do movimento negro em Curitiba.
Vicente Freitas morreu em 1926. Trinta e seis anos depois nascia Nair, que manteve a tradição de participar ativamente da cidade onde nasceu, se criou e vive.
Tornou-se servidora municipal em 1987, passando desde então por inúmeras unidades de atendimento odontológico. “Amo a odontologia”, resume ela.
Sobre a homenagem que recebeu, ela se diz orgulhosa e surpresa. Mas ressalta o todo: “É importante valorizar a raça negra.”
Ações
De acordo com Marli Teixeira Leite, titular da Assessoria das Políticas de Promoção da Igualdade Racial do município, as homenagens procuram justamente aumentar a representatividade dos negros.
“É uma forma de reconhecer a importância do trabalho diário e continuado na promoção do bem comum”, diz Marli. “Mais representatividade significa menos preconceito.”
Homenageados
Além de Nair, também foram homenageados Adailton Gonçalves, Lauri Silvério Miguel, Neura Aparecida Campos de Lima, Luiz Fernando Alcântara Araújo, Edna dos Santos, Nilo de Oliveira, Junia Cellenda Costa e Silva, Reginaldo Geraldo, Carlos Celso dos Santos Júnior, Sidney Francisco da Silva e Renato Ramos.
O evento
As Caravanas Étnico-Raciais fazem parte das políticas desenvolvidas pela Prefeitura de Curitiba, reforçando as ações afirmativas com objetivo de aumentar a representatividade e o reconhecimento das populações negra, indígena e cigana de Curitiba.
O Cajuru recebeu a segunda edição, reunindo apresentações culturais e feira de empreendedores, que expõem e comercializam produtos com raiz étnica (negra, indígena e cigana).
Outros três eventos serão realizados este ano, e cinco no ano que vem, contemplando todas as regionais da cidade.
Próximas edições das Caravanas
- Bairro Novo – 8 de outubro
- Santa Felicidade – 5 de novembro
- Tatuquara – 19 de novembro