Com o Memorial de Curitiba lotado e um público apaixonado pela obra de Conceição Evaristo, a Prefeitura e a Fundação Cultural de Curitiba abriram na noite deste domingo (16/6) a segunda edição do Festival da Palavra. Conceição, um dos expoentes da literatura brasileira contemporânea e voz ativa no empoderamento das mulheres negras, foi muito aplaudida e fez do momento uma festa.
A programação do II Festival da Palavra de Curitiba vai até sábado (22/6), com bate-papos, oficinas, shows e performances. Tudo é gratuito e pode ser conferido AQUI.
A homenagem começou ao som de tambores e ritmos musicais afro-brasileiros como pano de fundo para a declamação de textos de Conceição Evaristo. A apresentação, criada e dirigida por Caio Guimarães, contou com a participação das atrizes Cleo Cavalcante e Ingrid Bozza e das cantoras negras Kátia Drumond, Janine Mathias e Rúbia Divino.
O ritmo contagiante fez Conceição se levantar e dançar. Na plateia estavam também outras estrelas do festival, como o imortal da Academia Brasileira de Letras João Almino, a escritora e performer Luiza Romão, o escritor e ativista negro Nelson Maca e atriz e performer paranaense Denise Stoklos.
Força da palavra
Conceição Evaristo foi recebida pela presidente da Fundação Cultural de Curitiba, Ana Cristina de Castro, e pela assessora de Igualdade Racial da Prefeitura, Marli Teixeira. “Essa homenagem é uma forma de celebrar a força de suas palavras e mostrarmos que estamos juntos na luta pela igualdade social, de raça e de gênero”, disse Ana Castro.
Marli Teixeira destacou as atrações do Festival da Palavra e anunciou que Conceição Evaristo será tema também de um projeto de leitura, a ser realizado em julho no Centro de Atividades Afro-brasileira. “Um bom evento a todos”, desejou.
Na abertura também foi exibido um vídeo enviado por Paulina Chiziane, escritora moçambicana agraciada com o Prêmio Camões, um dos mais importantes da língua portuguesa. No vídeo, a autora agradece o acolhimento que teve em Curitiba quando participou em setembro do ano passado da primeira edição do Festival da Palavra.
Escrevivências
O bate-papo com Conceição Evaristo foi conduzido pela jornalista Aline Reis. Ao responder à primeira pergunta, sobre o conceito de “escrevivências”, a autora agradeceu especialmente as mulheres negras presentes. “Como mulher negra sei como é difícil para nós acessarmos determinados lugares. Desde as nossas ancestrais, condenadas à invisibilidade, nós percorremos esse longo percurso para nos fazer presente em determinados espaços. Cada mulher negra que está aqui carrega uma história de caminhada que não é só dela”, disse.
Ela explicou que o conceito nasceu durante o seu mestrado na PUC-RJ, em 1994, quando pesquisou sobre a produção literária e a poesia de escritoras e escritores negros. “Observei que não dava para separar o sujeito autoral do eu poético. Esse ato de escrever reflete a própria vivência, mas não é um simples jogo de palavras – escrever e viver. Este conceito nasce de uma experiência histórica e ancestral”, explicou.
Conceição esclarece que a origem do conceito está na ideia da mãe preta, que tinha como uma de suas funções como mulher escravizada contar histórias para os filhos do dominador. “A escrevivência é o processo da escrita que traz essa potência da oralidade e que subverte aquilo que era destinado às mulheres escravizadas”, diz a autora.
A escritora ainda falou sobre seus personagens e suas fontes de criação, sobre a construção do personagem negro na literatura brasileira e as mudanças nas academias de Letras, que estão mais receptivas à diversidade. Conceição Evaristo encerrou sua participação emocionando a plateia ao narrar o conto Olhos D’Água, um de seus textos mais conhecidos e título também de um de seus livros.
Contemplação
O estudante de mestrado na UTFPR, Júlio Rodrigues, de 25 anos, acompanhou a palestra. “Tudo o que ela escreve e fala mexe muito comigo. Tem a ver com o que eu penso e com o que eu vivo”, disse Júlio, que é de Manaus, morando atualmente em Curitiba. Acompanhado das amigas Giovana Soares e Luana Vargas, ele também elogiou o festival. “O evento foi impecável na organização. Muito bem elaborado”, atestou.
O casal Raquel Wandelli e Moacir Loth veio de Florianópolis especialmente para acompanhar o Festival da Palavra. Raquel disse que quer acompanhar tudo, palestras e oficinas. “Chegamos há poucas horas de ônibus, viemos direto para o Memorial, para ver essa maravilha”, contou a escritora e professora de Literatura, referindo-se à homenageada.
“Admiro muito o trabalho da Conceição Evaristo”, disse o ator de teatro Ariel Paske, que aguardava na longa filha que se formou para a sessão de autógrafos da escritora. Ele soube da palestra alertado pela amiga, Valentina, estudante de Relações Públicas em Porto Alegre, que veio visitar Curitiba e, num show de Janine Mathias, ficou sabendo da realização do festival.
O II Festival da Palavra é uma realização da Prefeitura de Curitiba, Fundação Cultural de Curitiba e Instituto Curitiba e Arte e Cultura com o apoio das seguintes instituições: Academia Paranaense de Letras, Editora Dublinense, Solar do Rosário, Escola de Escrita, Instituto Cervantes, Aliança Francesa, Cátedra de Estudos Irlandeses W.B Yeats e Amora.