Como aproveitar a aposentadoria quando esse dia chegar? A dúvida de muitos servidores ativos, que um dia vão se aposentar, pode ser respondida por outros, que já vivem esta etapa, uma fase que pode durar anos.
Gomes, Bertinato, Nancy e Vera fazem parte do grupo de 17,4 mil aposentados da Prefeitura de Curitiba. Cada um dos quatro está aposentado há um tempo diferente – de dois meses a 40 anos. Nesta sexta-feira (24/1), Dia do Aposentado, eles revelam a visão que têm da esperada aposentadoria.
Servidores da Prefeitura mantêm seu vínculo, quando aposentados, junto ao IPMC (Instituto de Previdência dos Servidores do Município de Curitiba), responsável também por 2.955 pensionistas.
Ser útil
Aos 95 anos, José Gomes da Silva completa 40 anos como aposentado em 2025. Natural de Recife (Pernambuco), Gomes, como é conhecido, se aposentou como médico-veterinário e exerceu outras funções na Prefeitura de Curitiba. Dentre elas, foi diretor do Zoológico. Lembra que participou ativamente de debates importantes que envolviam os conselhos Estadual e Federal de Medicina Veterinária.
Logo que se aposentou, começou a trabalhar como autônomo em clínica e, depois, em casa. Também deu aulas de português. Além da medicina veterinária, Gomes conta que cursou Língua Portuguesa, História e Geografia.
“A aposentadoria não é o fim. Pode ser um outro começo. As pessoas que estão na ativa deviam se preocupar para que não se sintam inúteis, não fiquem sem fazer nada. Cada um tem que se preparar não para a ociosidade, mas para ser alguém que existe como cidadão, alguém útil e pronto a ensinar o que aprendeu”, declara.
Atualmente, costuma ir uma vez por semana à Associação dos Aposentados da Prefeitura de Curitiba (AAPC), no São Francisco, para ver os amigos e conversar. “Aqui a gente se comunica bem”, diz. Ele conta que também é procurado por pessoas que conheceu ao longo da vida e que querem se aconselhar com ele. “Muito me gratifica ter pessoas que sempre me procuram para refletir sobre uma resposta”, afirma.
Susto e recomeço
José Antonio Bertinato, de 85 anos, trabalhou na Secretaria de Obras e é aposentado há mais de 35 anos. Ele diz que quando estava na ativa, chegava cansado em casa depois do dia de trabalho e lembra como foram os primeiros anos da aposentadoria: “Fiquei dois, três anos sem fazer nada, nenhum exercício físico. Tive uma ameaça de infarto e fui parar no hospital”, conta.
Depois do susto, Bertinato teve que se reinventar. “Tive os sinais e me cuidei. Tenho quatro safenas, cinco stents e marcapasso. Graças à medicina e à farmacologia, estou bem. Passei a fazer exercícios, uma hora de caminhada por dia, parei de fumar e controlo a alimentação”, diz.
Hoje, Bertinato mantém uma rotina com várias atividades. “Eu jogo sinuca, baralho e tenho quatro filhos e sete netos que aconselho. Também adquiri imóveis e cuido dos inquilinos", diz ele, em meio a uma partida de sinuca com os amigos na Associação dos Aposentados. Se tivesse que aconselhar um novo aposentado, diria: “cuide da saúde e aproveite o máximo”.
Tempo para viver
Aposentada como professora há 17 anos, Nancy Maria Marquete, de 67 anos, considera que a melhor parte dessa fase de vida é a oportunidade de ocupar o tempo livre. Ela lembra que quando estava na ativa não tinha tempo para fazer muitas coisas que gostaria.
Seu ponto de partida, assim que se aposentou, foi dedicar-se à família. Depois, veio o trabalho voluntário. Há mais de 14 anos ela participa da Pastoral da Pessoa Idosa e, com outras voluntárias, visita pessoas nessa faixa etária. “O trabalho voluntário é uma forma de se doar, por tudo o que vivemos a vida inteira. E ajudou a me preparar para ser também uma pessoa idosa”, declara.
Nancy é bastante ativa. “Faço coral, costura, estudo italiano e não perco uma oportunidade de viajar. Amo Curitiba, então agora que não pago mais passagem, pego meu ônibus e vou. Também sou dona de casa, mãe, avó e bisavó”, diz. No começo de cada ano, Nancy organiza quais atividades planeja fazer. “O que eu quero e posso fazer para ser feliz, adaptando para as minhas condições físicas e financeiras”. Neste ano, quer voltar a fazer artesanato.
Ela diz que a fase da aposentadoria serve para que as pessoas desenvolvam projetos que ficaram guardados e é uma incentivadora do aprendizado de línguas estrangeiras. “Estudar um idioma ajuda muito”, avisa.
Nancy também defende que as pessoas procurem os amigos e façam novos, assim como aconteceu com ela, frequentando a AAPC. “Os amigos são fundamentais”, ensina. Outra dica da aposentada é ter sempre algo a fazer no dia seguinte. “Precisamos dormir já pensando o que faremos amanhã. E mais: precisamos de rotina. E guardar tudo no lugar certo, se não a gente não acha mais”, brinca.
Para Nancy, é preciso que o aposentado esteja preparado para enfrentar a nova etapa. “Se você se isolar, é perigoso. Eu não parei, toda semana ia visitar minhas amigas, fazia novas atividades e cuidava da minha saúde física e psicológica”, afirma.
Recém-aposentada animada
Vera Marcia Gobbo Tedeschi, de 64 anos, iniciou a aposentadoria em dezembro do ano passado. Aposentada como assistente social do IPMC, para ela, essa fase ainda parece como férias. “Estou cheia de compromissos, cheia de turmas, me sinto animada”, contou Vera depois da aula de yoga, com a roupa da atividade.
“Sinto falta dos amigos que deixei no local de trabalho, sinto muita gratidão pelos anos que trabalhei no IPMC, pela experiência que adquiri e pela jornada especial ao lado de pessoas incríveis”, diz. Para ela, a melhor parte dessa fase é a liberdade.
Parte das atividades profissionais de Vera ao longo da carreira na Prefeitura envolveu auxiliar os recém-aposentados nesse momento de transição. “Eu via as pessoas perdidas, tentando se adaptar a essa nova vida e pensava ‘um dia vou estar aqui’. Isso facilitou minha jornada”, afirma.
Ela escreveu uma carta refletindo o que a aposentadoria significava em sua vida. “Enxergo como uma árvore da vida. Na trajetória profissional, fiz as raízes alicerçadas por 50 anos, comecei a trabalhar aos 14 anos e fui agregando coisas boas. A aposentadoria são os galhos que me levam”, reflete.
“Agora penso em saborear e trazer o tempo a meu favor”, resume. A dedicação à família é um dos planos de Vera. “Quando visitava meus filhos e netos nos Estados Unidos, as datas me escolhiam, agora eu quero escolher as datas que vou e volto. Também quero ficar com a minha mãe, me dedicar a ela”, diz.
Viagens também estão nos planos. “Estou organizando um passeio para Gravatal, em Santa Catarina, quero ir para a Patagônia e ainda conhecer Portugal”, conta a aposentada, que também espera aprender uma nova habilidade ou aprofundar em algum conhecimento nesse período.