Curitiba trilhou um longo caminho até alcançar o patamar de excelência no planejamento urbano, área na qual é conhecida mundialmente. Na origem da cidade, o povoado fundado em 1654 – e elevado à condição de vila em 1693 – contou com iniciativas isoladas de organização do espaço urbano.
A primeira delas ocorreu em 1721 quando o ouvidor Rafael Pires Pardinho, designado por Portugal, decidiu que as águas do Rio Ivo, na região da atual Praça Zacarias, seriam usadas para beber. Já o Rio Belém deveria receber o esgoto da cidade, chamado então de “águas servidas”. A então Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais contava com cerca de 1,4 mil habitantes.
O ouvidor Pardinho também definiu o arruamento da praça central, batizada de Largo da Matriz (atual Praça Tiradentes), seguindo os moldes de urbanismo da Península Ibérica, onde cada cidade tinha a sua “plaza” com grandes dimensões. Essa influência teve origem no tempo em que Portugal e Espanha estiveram sob a tutela de um mesmo monarca: o espanhol Felipe II.
Apesar de suas iniciativas para organizar o espaço urbano, o ouvidor Pardinho não conseguiu vencer a resistência dos moradores da então Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais que insistiam em deixar seus animais de criação soltos pela cidade. Muitos desses animais invadiam não apenas a praça central como as residências e até a Igreja Matriz.
Segundo documentou o professor e historiador Ruy Wachowicz (1936-2000), em seu livro ‘História do Paraná’, o ouvidor Pardinho chegou a implantar o Potreiro da Câmara numa área afastada do centro, onde ficavam confinados os animais. Porém, as cercas do Potreiro Municipal eram constantemente derrubadas. Foram necessários cerca de 100 anos para que, finalmente, os cavalos, vacas de leite, porcos, cabras e galinhas deixassem de vagar pelas áreas públicas de Curitiba.
No ano de 1820, Curitiba recebeu a visita do naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire. Em seus escritos deixou registrado que a vila conformação circular e abrigava cerca de 220 habitações. A maioria da população era de origem europeia e cultivava em seus quintais frutas como pêssegos, cerejas e maçãs. A iluminação pública era escassa e deficiente. Os lampiões só eram abastecidos quando eram liberados recursos da Província de São Paulo, a qual o Paraná era vinculado.
Vinte e dois anos mais tarde, já erguida à condição de cidade, Curitiba registrava mais de 5,8 mil habitantes. O aumento populacional levou à primeira expansão da cidade, ocorrida em 1858. Autorizado pelo governo municipal, o engenheiro Frederico Hégreville inspirou-se no projeto realizado pelo engenheiro francês Pierre Taulois que sugeria a mudança da conformação circular de Curitiba e a desapropriação de áreas no centro para formar um novo traçado com ângulos retos. Aos poucos, a cidade foi ganhando novas ruas com cruzamentos regulares e passou a ter um desenho retangular, melhorando a circulação dentro da malha urbana.
No ano de 1886 foi implantando em Curitiba o primeiro parque do estado do Paraná. Tratava-se do Passeio Público, que representou a primeira grande obra de saneamento da cidade. O local, que antes era um charco insalubre – e foco de muitas doenças – deu lugar ao primeiro parque do Estado do Paraná e também ao primeiro Zoológico. A obra foi realizada por ordem do presidente da Província, Alfredo d’Escragnolle Taunay. Em pouco tempo tornou-se um dos locais de lazer preferidos pela população da cidade que, em 1890, já alcançava mais de 24,5 mil habitantes.
O Plano Agache
Encomendado pelo então prefeito Rozaldo de Mello Leitão, e concebido pelo urbanista e arquiteto francês Alfredo Agache, este foi o primeiro plano de urbanização feito especialmente para a cidade de Curitiba que já tinha uma população estimada de 140 mil pessoas. Desenvolvido entre 1941 e 1943, o plano sugeria a adoção do sistema radial de vias, descongestionando o centro, e a organização da cidade por setores: industrial, comercial, administrativo, educacional, desportivo e residencial.
O Plano Agache também previa ampliação da rede de água e esgoto, a criação de parques nos subúrbios e a formação de lagos artificiais para a prática de esportes, aproveitando as curvas dos rios. Entre os anos de 1943 e 1946, durante a administração do então prefeito Alexandre Beltrão, Curitiba começou a receber as obras de saneamento previstas no Plano Agache. Apesar de bem detalhado, o plano teve sua implantação limitada pela falta de recursos.
Naquele mesmo período ocorreu o alargamento de vias importantes de Curitiba, como a Rua XV de Novembro e o prolongamento da Avenida Marechal Floriano até o município de São José dos Pinhais, onde estava sendo construído o aeroporto Afonso Pena.
Nas administrações posteriores, outras iniciativas de planejamento urbano ajudaram a organizar a cidade. Foram implantadas outras grandes avenidas, como as atuais Visconde de Guarapuava e Sete de Setembro. Também foram implantadas as galerias pluviais da Rua XV de Novembro, o recuo obrigatório de cinco metros para novas construções e ocorreu a concentração de indústrias perto da então Estação Ferroviária.
Comissão de Planejamento de Curitiba
Em 1954, durante a gestão do então prefeito Ney Amintas de Barros Braga, foi organizado o primeiro grupo técnico com o objetivo de rever o Plano Agache. A ideia era modernizar o plano, adaptando-o à realidade de Curitiba que seguia crescendo e contava com uma população superior a 180.500 pessoas. Essa comissão daria origem ao Departamento de Urbanismo da Prefeitura Municipal de Curitiba e, no futuro, iria inspirar a formação de novas equipes técnicas para planejar o desenvolvimento da cidade.
Veja na próxima reportagem da série: a origem do Ippuc, o Seminário Curitiba do Amanhã e a aprovação do primeiro Plano Diretor de Curitiba.