A diminuição de velocidade dos veículos nos grandes centros urbanos é uma experiência que deu certo em outros países e em São Paulo (SP) e que por diversos motivos é apoiada por especialistas da área de trânsito.
Para a fundadora e coordenadora do Núcleo de Psicologia no Trânsito da Universidade Federal do Paraná (NTP-UFPR), Iara Picchioni Thielen, a instalação da Área Calma em Curitiba é importante para a mobilidade e principalmente para a segurança de pedestres. “É inaceitável a ? ?mortalidade de pedestres na cidade. Com a velocidade máxima de 40 km/h, acredito que Curitiba será capaz de eliminar a mortalidade de pedestres na região da Área Calma. Além disso, essa medida atuará como fator educativo, indicando que a prioridade é sempre do pedestre e os motoristas poderão aprender a respeitá-los. Também acredito que os ganhos advindos com essa medida poderão ser estendidos para outros locais onde a concentração de pedestres também é elevada”, afirma.
Estudos realizados em diversos países mostram que, a partir de uma velocidade de 40 quilômetros por hora dos veículos, cresce exponencialmente o risco de uma lesão fatal dos pedestres em atropelamentos. Com o veículo a 40 km/h, há 20% de risco de lesão fatal; a 50 km/h, 50% de risco; a 60 km/h, 80% de risco; e, a partir de 70 km/h, 100% de risco. Quanto maior a velocidade, menor o tempo de o condutor frear e evitar um acidente, pois o veículo percorre muito mais distância para frear completamente estando em uma velocidade maior.
O superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Luiz Carlos Mantovani Néspoli, lembra que velocidades menores permitem que os condutores prestem maior atenção ao seu redor e reajam melhor diante de situações inesperadas. Ele destaca como exemplo um estudo realizado no laboratório de neuromarketing da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, que verificou como o condutor distribui sua atenção em um cruzamento. “Foi constatado que o ambiente do cruzamento oferece inúmeras atrações e que a faixa de pedestre é a que menos recebe a sua atenção. Em razão disso, foi desenvolvida uma campanha educativa com ênfase neste aspecto que produziu resultados muito positivos. A velocidade mais baixa também facilita a atitude de respeito ao pedestre, criando condições mais favoráveis para campanhas educativas”, diz.
A menor velocidade dos veículos na Área Calma também permite o compartilhamento dos modais na via, o que é apoiado pelos especialistas. “O compartilhamento é o caminho da cidadania. Todos devem compreender que os espaços públicos são de todos e que o direito a sua ocupação é igualitário??. No entanto, é preciso um processo educativo de orientação específica para fomentar o uso compartilhado”, destaca a professora da UFPR.
O superintendente da ANTP lembra que os carros foram aos poucos tomando todos os espaços da cidade, sem uma grande percepção da população. “Formou-se uma cultura, mas há mudanças no ar. Hoje, isso começa a ser questionado, em especial por jovens. A medida que os gestores públicos forem dividindo este espaço, tornando-o menos inóspito e mais aprazível, a sociedade com o passar do tempo muda esta visão e a cultura muda. É necessário tempo, mas será inevitável. É necessário humanizar os espaços urbanos”, afirma.
A redução da velocidade nos centros urbanos tem sido adotada em diversos países e em também em cidades brasileiras. “Recentemente, a experiência de São Paulo se mostrou eficaz, com a redução da velocidade nas marginais, resultando em uma redução significativa do número de acidentes e sem redução significativa no tempo de trajeto, ensinando que a redução da velocidade resulta em muito mais benefícios que prejuízos”, lembra Thielen.
Néspoli informa que o International Traffic Safety Data and Analysis Group, órgão vinculado à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, observa a estatística de acidentes de trânsito em mais de 30 países europeus, asiáticos e norte-americanos, descrevendo, anualmente, as principais políticas de segurança viária em todos eles. Na totalidade dos países deste observatório, a velocidade em vias urbanas já está limitada a 50 km/h e todos eles já estabeleceram em áreas específicas das cidades zonas de velocidade máxima de 30 ou 40 km/h.
“Além das medidas de redução, naturalmente, é necessária a comunicação com a população, um processo educativo e de convencimento, cujos resultados irão demonstrar a veracidade da informação do poder público e, com isso, atraí-la cada vez mais para a causa e a mudança cultural”, diz o representante da ANTP.